terça-feira, 5 de julho de 2011

Travessia do Sofrimento

  Fomenta a ira do céu negro desse Aqueronte Infernal
  para os dois poetas. Com a mão ele tenta se esconder
  a cena tão apavorante. A boca de um castigado
  mastiga com a fúria que resta em sua alma. Outro
  cadavérico como o gelo bóia rente ao barco dos dois
  viajantes. Dedos de um torturado tocam o umbigo
  de uma infeliz criatura. O poeta destemido interpreta
  essa lamuriante cena com a frieza de costume, como
  já sendo do mesmo mundo, mas com poucas surpresas
  terrificantes. Sua mão firme tenta passar calma ao 
  poeta assustado. Relembra-o que ele só está de 
  passagem pelo lugar e que se tiver fé, irá passar 
  incólume dessa atroz região. Mas como não estremecer
  de aflição quando se vê um corpo se contorcendo
  por aquelas águas do rio maldito? Esse pesadelo
  de cadáveres possuídos nada mais são, do que uma
  penitência sem-fim. Sequer podem possuir andrajos.
  Os peitos da penitente murcharam a tamanho suplício.
  As ondas sepultam os sonhos de esperança dos 
  infelizes prisioneiros do rio. Todos ali refletem a
  mais pura miséria de fé. Nenhuma prece é atendida
  por entre as sufocantes águas negras. As coxas do 
  poeta abalam os movimentos para um mínimo de
  segurança mental. O sacrifício do âmago é exposto
  cruamente ante os olhos prescrutadores do poeta
  intrépido, que mais uma vez adverte o seu 
  companheiro de que tudo aquilo deve servir de
  aprendizado. A sua túnica negra contrasta com a
  do céu rubro que a muito deixara e repensa sobre
  o que está vivenciando até então. A barca segue,
  com as remadas de Caronte, impassível ao músculo
  que tenta se apoiar no barco como um sinal de saída.
  Ante a tamanho sortilégio do destino, o pânico do
  poeta é diminuído conforme o tempo que passa
  sobre aquelas paragens, mas continua a ele o 
  sofrimento visual. Vendo isto o seu guia
  diz palavras sábias para encoraja-lo.


  

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